quarta-feira, dezembro 12, 2007

Ampulheta

Uma palavra menos agressiva era só o que queria de ti. Um gesto. Uma carícia. Que uma Cor menos cinzenta pairasse sobre nós. E florisse a nossa relação. Algo que me desse, que nos desse alento à alma. Porque só me apetece chorar e não consigo. Porque é que acho que a vida não é justa connosco, assim? És o contrário de mim... porque fazes tudo menos bem ao invés de te amares, de te cuidares. Não sabes que só te magoas. E que feres o escasso espaço da relação pai-filha que existe – só porque és meu Pai!
Não é meu, esse desejo, mas é o que sinto! Não sei se te amo, PAI!
Como eu gostaria de te amar. Pois, eu não sei se daquela maneira que tu querias, nem nunca mo disseste!!! Tu deverias ser o pilar de toda uma maturidade que eu amanhei à força... Porque, estiveste lá quando “outros” não estiverem!!! Mas não consigo encontrar referências, por mais que me esforce! Desculpa, Pai se falhei como filha, mas não sei como falar contigo nem como te amar! Lembras-me uma ampulheta que, volta e meia, tem de ser virada, pela mão da avó, para te lembrar que tens uma filha. Parece – lhe que, ultimamente, a vida tem passado, sem isso!

No entanto, o que edifiquei foi à minha custa. Já me habituei a coisas que nunca me confiaste: Nunca me leste estórias. Não me puxaste a roupa quando eu queria adormecer com medo do escuro. Não sabias como fazer! Eu não sabia que não sabias. E não quiseste aprender.

Nunca me telefonas. E ainda te zangas comigo se te telefono. Gritamos sempre que estamos juntos, berramos quando não concordamos. Não tomas os medicamentos. Bebes que nem um doido para esquecer o quê? Uma vida que tu próprio alimentaste? E porquê? Vives obcecado por uma vida que te deixou marcas e não avanças para lado nenhum.
A tua ideia é continuar a virar a ampulheta até partir. Partir será o teu fim. Forças e continuas a forçá-la pela mão da avó. Uma mãe que sempre foi bengala de todos, de ti, de mim, de nós.
Mas até quando…ela não vive para sempre. Mas tu continuas a sonhar, a esperar que Deus não a leve. E explicar-te que as coisas não são assim. E que crescer dói, e que tu nunca cresceste. E que teimas em fazê-lo a todos os minutos. Como dizer-te isto sem que berres comigo e te zangues! Estou tão cansada!
Tens uma auto-estima miserável como nunca vi ninguém ter... e sem necessidade queres demonstrar ao mundo que és um sem abrigo e Porquê? Nunca percebi. Lidas com o teu sofrimento como se fosse uma representação assente ou um recurso, o único que dispões para chamar à atenção…
Não sei Pai. Eu quero gostar de ti e quero que tu gostes de ti.
Nunca te disse isto que acabo de escrever nestas linhas. Chorarias baba e ranho e nunca chegaria até ti. Nunca o consegui. Nunca o conseguiste. Vermo-nos um ao outro, é o nosso problema maior!
Passamos, simplesmente, um pelo o outro!